Comédia de Enganos
Depois de há umas semanas atrás ter construído um questionário que prometia (enganosamente) a resposta à pergunta: "qual é o seu tipo de humor?", dei por mim a pensar qual era o meu tipo de humor, afinal. Não é nenhum dos definidos nas soluções, o que só prova quão medíocre era o quiz e, por conseguinte, quão inapta a sua autora.
O meu tipo de humor é, sem dúvida, o humor dos enganos.
Adoro as gaffes, as gralhas que nunca deviam ter sido impressas, os lapsus linguae, as conversas de surdos, os bloopers.
A pessoa que atende o telefone à confiança, pensando que o interlocutor é outro.
O miúdo que dá a mão a uma "mãe" que não é a sua.
O pivot que já está em directo e não sabe.
Gosto dos erros, dos mal entendidos, dos desentendimentos. Na televisão, na mesa de café, no cinema, no supermercado, nos filmes. Desde o "Aonde é que pára a polícia" que via com o meu pai e o meu irmão, quando tinha sete anos e estava mais concentrada no facto de eles se rirem do que com o que se passava no filme, até às comédias portuguesas dos anos 40, em que acabava tudo no Torel. Sempre fui adepta das sitcoms, precisamente por serem comédia de "situação" (diz o dicionário que é "ocorrência" e "vicissitude", conceitos que prometem). E toda a gente sabe que se há coisa propícia a enganos é uma casa artificial, com portas para todos os lados, onde personagens entram e saem de cinco em cinco minutos.
É por isso que entre teatro e cinema escolho o primeiro. Porque, vendo bem, é como se estivessemos todos dentro duma sitcom (mesmo quando a peça é dramática): também é uma casa artificial, com várias portas e uma data de gente a entrar e a saír de cena - não só no palco mas também no público, há muita malta que não aguenta mais de uma hora sem ir à casa-de-banho.
Até hoje as peças de que melhor me lembro (e vou ignorar propositadamente o Peter Pan, onde fiquei fascinada porque a Rita Blanco tinha voz de desenho animado e voava, imagine-se!) mais não são do que um gigantesco conjutno de enganos: "Dois Amores" (de Ray Cooney) e "Jantar de Idiotas" (de Francis Veber). E são absolutamente geniais.
O meu livro preferido, depois de ter lido já muita coisa boa, profunda, bem vista, sim senhora, continua a ser "A Crónica dos Bons Malandros", do Mário Zambujal, sobre a quadrilha de ladrões mais desajeitada de sempre, e percursora no "assalto à mão desarmada".
Quando é a minha vez de escrever, as minhas personagens preferidas também são as inaptas, as ignorantes, as trapalhonas (gosto dos derivados de "trapalhada", não era qualquer alusão aos Malucos do Riso brasileiros - Os Trapalhões!). Gosto muito de escrever a torrente livre de pensamentos (?) de Cristiano Ronaldo ou de acrescentar entradas no dicionário muito próprio de Denise e Maria Delfina.
Apesar de ser uma perfeccionista inveterada (ou invertebrada, como diria Denise de Magalhães) aquilo que me faz rir é a imperfeição. As falhas. Não sei se de admiração se de nervoso. Talvez de ambos.