A primeira coisa que destaco na notícia sobre as posições a favor e contra as touradas, no Público, é o facto do Presidente da Câmara de Viana do Castelo se chamar Defensor de Moura (espero que o primeiro nome seja Apologista).
Quanto ao resto, sublinho uma vez mais os argumentos brilhantes dos aficionados, que me fazem lembrar um saudoso (e acalorado) Prós e Contras em que Gonçalo da Câmara Pereira comparou as touradas de morte às viagens que fazemos na auto-estrada, matando muitos mosquitos, cujas carcaças ficam no vidro do nosso carro. Desta vez o prémio vai para Afonso Gonçalves Ferreira - seja lá quem for - que diz que proibir uma tradição como a festa brava "é o mesmo que proibir o fandango ou o vira do Minho". Pois claro que é! Até porque tanto os campinos das lezírias como as minhotas fazem questão de agredir qualquer espécie animal durante a sua coreografia. Não são muito exigentes, qualquer coisa serve. É ver minhotas a usar os seus pesados colares de ouro para chicotear chinchilas! Parecidíssimo com uma tourada, lá está.
Paulo Caetano, por seu turno, recorre a um argumento mais clássico, que é o facto dos manifestantes não reclamarem com os restaurantes que servem carne e peixe. Eu não sei que estabelecimentos frequenta o Paulo, mas naqueles em que eu normalmente janto, quando escolho "dourada na grelha" não surge, como que por magia, um palco, cheio de cor, luz e som, em que o peixe é lentamente escalado e regado com limão, enquanto os convivas do restaurante aplaudem. Também já almocei, inclusivamente, com indivíduos que pedem bifes mal passados, e nunca sucedeu trazerem a vaca para o centro da sala, para cortarem um naco de alcatra, enquanto gritávamos "bravo, bravo", e lançávamos flores para junto do empregado de mesa.
Para acabar em beleza, deixo-vos o testemunho comovente do veterinário e crítico de touros (polivalência acima de tudo) Domingos da Costa Xavier. Conta ele: "Já lá vão muitos anos convenci, em Évora, um jovem estudante a ir para o centro do redondel. Ele foi e, passados uns minutos, já estava sem dentes. Muitos anos depois, numa outra cidade, um indivíduo veio ter comigo, perguntou-me se não me lembrava dele. Então ele esticou a mão e disse: 'Sou o Dantas e quero agradecer-lhe, pois por causa de si é que hoje sou aficionado'. Era o mesmo jovem que muitos anos antes eu incitara a saltar para a arena e que acabou por ficar sem dentes".
Fica assim provado que, enquanto houver Dantas, existirão touradas em Portugal. Porque o género de pessoa que agradece ter ficado sem dentes (sem estar a dirigir-se ao dentista que lhe arrancou os sisos que tantos tormentos lhe davam) vibrará sempre com a bela "festa brava".